segunda-feira, 14 de março de 2011

SABEDORIA PORTÁTIL

Sempre cultivei grande simpatia pela sabedoria condensada dos provérbios.
         A dimensão sinótica dos aforismos revela, de forma cabal e pronta, a maneira de ser, estar e sentir dos povos em suas aventureiras navegações, no largo e tortuoso mar das interações gerais.
         Gosto dessa sabedoria “fácil”, direta, objetiva, totalizada, globalizante e finalista. Não a julgo sob prisma crítico, apenas a aprecio. Entendo-s como sobejamente útil, funcional e gostosamente intrigante.
         Durante muito tempo só os almanaques nos abriam oportunidade de convivência com essa alegre (e sempre oportuna) erudição popular. Hoje, um livro bem engendrado me chega às mãos ao sabor do acaso. Li e reli a peça e não me perdoaria se não gerasse a chance de dividi-lo com meus apreciados leitores. É o que faço a seguir. Selecionei algumas. Percebam o condimento lógico das mensagens.
         “Melhor ser ruivo do que sem cabeça” – esse é irlandês. Os alemães dizem que “onde não há inimigo, há luta na certa”... Os italianos concluem – “quem tem amor no peito tem esporas nos flancos”. “No dia da vitória ninguém se cansa” dizem os árabes. Já os chineses recomendam – “deixe todo o mundo varrer a neve de sua porta, mas não se meta com a geada no telhado do vizinho...”
         Um espanhol, provavelmente basco, disse – “se eu morrer te perdôo, se não, veremos”. Na Pérsia dizia-se – “por uma orelha se escuta e pela outra se esquece”. Em sânscrito escreveu-se – “não é defeito do poste se o cego não o vê”. Os hindus sentenciam – “cada homem é guardião de sua própria honra”, enquanto os iugoslavos asseveram – “não é fácil encontrar o bem mas é fácil reconhecê-lo”. Os portugueses alertam – “por mais cedo que se acorde não se pode apressar a aurora”.
         Os gregos comentavam – “gato de luvas não pega ratos”. Os japoneses dizem – “é melhor uma boa ação perto de casa do que ir longe queimar incensos”.
         “O bajulador tem água numa mão e fogo na outra” – dizem os austríacos.
         “Na dúvida, fique onde está” – aconselham os ingleses. Os franceses são sutilmente picantes ao recomendarem – “tranque sua porta e preserve a honra de seu vizinho”. Os russos não poderiam ficar calados e certa feita disseram – “quem empresta um livro deveria ter uma mão cortada, quem o devolve, as duas”. “A segunda palavra provoca a briga” – observam os húngaros. E assim por diante. Verdadeiras jóias da sabedoria popular, perfeitamente assimiláveis e transportáveis, pois cabem no istmo de um soluço ou no entreato de um olhar.
         Gosto muito também das moleques variantes a respeito dos conhecidos e sovados provérbios, hoje já sem geografia e identidade nacional. “Onde há fumaça, o ar é irrespirável”, “Quem corre porque quer, não cansa – cansa os outros”, ou ainda: “o sol nasce para todos os telhados”. “O povo aumenta, não inventa, mas se contenta”. “Quem dá aos pobres fica com problemas de caixa”. “Quem tudo quer, paga mais e à vista”. “Em boca fechada não entra mosca, nem sai”. “Quem tem boca vai a Roma – quem não tem, sai...” Já os portugueses são enfáticos quando sinalizam: “Dize-me com quem andas e te direi quem te acompanha”.
         Dizem que o célebre Ibraim Sued, certa vez, ao concluir sua sábia locução, arremeteu um provérbio de conteúdo absoluto para não deixar dúvidas em seu comentário relativo. Disse: “...e a caravana passa enquanto os cães piam”. Alguém reclamou: “Cães ladram, não piam – ora pois”. Ao que Ibraim respondeu – “Os cães são meus e fazem o que eu mandar – ora pois”!
         Concluo invocando a sabedoria latina, jeitosamente portátil e reconhecidamente utilitária que diz: “As palavras voam, os escritos permanecem...”
         As editoras decidem. Decidem ou apenas lucram? A indagação não é proverbial mas bem que poderia ser...      

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